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“DESCOMPLICA, UNINA!”: Os neologismos em textos literários e letras de música

Nesse texto do “Descomplica, Unina!”, você vai conhecer o que é neologismo, o nome dado a criação de palavras.

Nesse texto do “Descomplica, Unina!”, você vai conhecer o que é neologismo, o nome dado a criação de palavras. Para isso, trarei como exemplos textos literários e letras de música.

Quando estudamos a língua portuguesa, aprendemos que a língua é viva, está sempre mudando, novas palavras vão surgindo, coisas novas vão sendo criadas… Para isso, elas precisam ser “batizadas” com um nome,mas, muitas vezes, esses nomes são criados, como acontece, muitas vezes, nas letras de música.

Alguns neologismos são criados para representar algo e outros apenas estão ali para dar rítimo aos textos. Um grande exemplo, dessa criação para rima, está presenta na música “Sina”, de Djavan, em que o cantor e compositor utiliza o nome de um outro cantor, Caetano Veloso, transformando-o em verbo.

Veja o trecho destacado em negrito:

“O luar, estrela-do-mar
O Sol e o dom
Quiçá, um dia, a fúria desse front
Virá lapidar o sonho até gerar o som
Como querer caetanear o que há de bom”

Ao verbalizar Caetano, inferimos que Djavan demonstra amor e admiração ao amigo e subentende-se que o verbo “Caetanear” significa “compor como Caetano”.

É o mesmo que acontece no poema “Neologismo” de Manuel Bandeira, em que o poeta criou o verbo “teadoro”, a partir da junção da expŕessão “te adoro”, a fim de, brincar com o nome da amada do eu-lírico do poema, chamada “Teodora”.

Veja como isso acontece nos trechos destacados em negrito:

Neologismo

Beijo pouco, falo menos ainda.
Mas invento palavras
Que traduzem a ternura mais funda
E mais cotidiana.
Inventei, por exemplo, o verbo teadorar.
Intransitivo:
Teadoro, Teodora.

Essa brincadeira com as palavras é muito comum na nossa cultura, fazemos isso não só na arte, criamos expressões em conversas ou em brincadeiras com amigos.

Um outro autor que fez muito uso de neologismo, em suas narrativas, foi Guimarães Rosa. O trecho, logo a seguir, foi retirado de um de seus contos do livro Sagarana: “O Burrinho Pedrês”.

Os termos destacados são neologismos elaborados a partir da junção do prefixo “des”, que dá ideia de sentido oposto ou negativo, a termos já existentes no português para a criação de uma nova palavra.

“— Desassa a tua mandioca!” (ROSA, 2015, p.38).

“— Mas, minha vara, ela tinha mandado longe. Não falei?…
Josias foi o mais desfeliz, porque foi jogado para tudo quanto era lado, com a monstra sapateando em cima dele e chifrando…” (ROSA, 2015, p.44).

Já em outras situações, como em letras de músicas, muitos neologismos são criados para representar algo metafórico, que transcende a nossa imaginação como, por exemplo, os termos: “Odara”, Shimbalaiê”, “Ilariê”, “Avohai” entre outros. Esses termos e tantos outros criados, que muitas vezes cantarolamos, não têm qualquer significado aparente, não são onomatopeias (palavras que tentam imitar o som) ou formas reduzidas de palavras ou expressões já existentes, e sim neologismos metafóricos.

O pesquisador musical Rodrigo Faour acredita que articulações vocabulares, como essas, sejam parte de uma tradição criativa comum ao ramo musical, pois muitas combinações de notas musicais sugerem sons de palavras e isso acaba sendo um estímulo para alguns compositores, que mesmo antes de criarem letras para suas canções e certos improvisos podem virar partes da letra propriamente dita. (FAOUR, 2010).

Além da criação de novos termos, com intuito, muitas vezes, de dar rítimo a uma música ou poetizar algum termo, como vimos nos textos acima, o neologismo também foi um recurso utilizado, em expressões de letras de músicas, para “driblar” a censura que vigorou no Brasil de 1964 a 1988, isso fez com que muitos compositores encontrassem subterfúgios para tratar, nas cançãos, temas não permitidos.

Veja o exemplo na letra da música de Gilberto Gil.

Minimistério (Gilberto Gil)

[…] Ande por onde andam
Aquelas minas
Aquela velha gama
E aquela nova
Aquela nova minimina, flor do ministério
Quero dizer, do mistério (Que mistério tem Clarice?)
[…] Procure conhecer melhor
Seu minimistério interior
Procure conhecer melhor
O cemitério do Caju
Procure conhecer melhor […]

Segundo Barbosa e Da Silva (2014), ao analisarem a música de Gilberto Gil.

A palavra “minimistério” é composta pelo mini, prefixo de pequeno, e mistério, substantivo. Aqui poderíamos supor que se trata do mistério envolvido no desaparecimento de várias pessoas durante a ditadura, nesse caso, em especial, o desaparecimento da “minimina, flor do ministério”, isto é, da pequena menina que poderia trabalhar em uma repartição pública (ministério). Ao usar “minimistério” o autor nos faz inferir que aos olhos dos ditadores o desaparecimento da garota era um pequeno mistério, sem importância, mas na verdade para seus amigos e família se tratava de um grande mistério. No caso de “minimina” a palavra é composta por mini, prefixo de pequeno, e mina, gíria que vem do vocábulo menina (substantivo). (Barbosa e Da Silva, 2014).

Vale destacar, por fim, que do processo de criação de novas unidades lexicais, resulta o neologismo. Esses exemplos mencionados são alguns de tantos neologismos que existem no nosso idioma. Segundo Alves (1990, p.5), “o acervo lexical de todas as línguas vivas se renova. Enquanto algumas palavras deixam de ser utilizadas e tornam-se arcaicas, uma grande quantidade de unidades léxicas é criada pelos falantes de uma comunidade linguística.”

Gostou? Ficou com dúvidas? Quer sugerir outros temas? Entre em contato com o setor do PROLAC, o Programa de Letramento Acadêmico da Faculdade Unina: carla.sanches@unina.edu.br .

Texto escrito pela professora Carla Emanuelle Sanches.

Referências utilizadas:

Alves, Ieda Maria. Neologismo: criação lexical. São Paulo: Ática, 1990.

BARBOSA, Fabiana Vieira; DA SILVA, Ivanilson José, 2014. O Neologismo Lexical em Canções de Gilberto Gil. Disponível em: <http://www.gelne.com.br/arquivos/anais/gelne-2014/anexos/217.pdf>. Acesso em: 27/08/2021, às 22h50.

FAOUR, Rodrigo. Outras Palavras. Revista Língua Portuguesa, São Paulo. S.P, ano 4, n. 55, p. 23, maio de 2010.

ROSA, João Guimarães. Sagarana. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015.

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